terça-feira, 29 de março de 2016

Apenas na memória

Saul Landell

apenas na memória
o momento
ido.

havia labirintos, que serpenteavam
o silêncio dos dedos,
sobre o papel imaculado.

tanto de ti ficou,
tanto,
nesses momentos tao breves.

por vezes, ainda dói
como se fosse uma lâmina,
a cortar e a deixar marcas indeléveis.

mais tarde, tão mais tarde
notei que a pele continuava macia,
e sem vestígios de cicatrizes.

meramente a saudade,
alastrava-se  por todo
o corpo.

apenas na memória
o momento
ido.



©Piedade Araújo Sol  2016-03-28

terça-feira, 22 de março de 2016

No cimo da escarpa

Richard Blunt


No cimo da escarpa,
os pássaros exercitavam
o seu voo em círculo.

Juntei a cinza do teu olhar,
com o musgo do meu,
e ficamos silenciosos a observar.

No cimo da escarpa, fez-se noite
com o repouso dos pássaros
as estrelas ficaram mais cintilantes.

Em ninhos improvisados,
fez- um silêncio cavado,
e fantasmagórico.

Era tarde, muito tarde
unimos os corpos, e tudo ficou
colorido no cimo da escarpa.

Depois,
começamos a contar o passar
dos dias pelos dedos.


©Piedade Araújo Sol  2016-03-18

terça-feira, 15 de março de 2016

Trilhos


Karen Hollingsworth

Uma linha contínua________inteira,
fui por aí, perdida em encruzilhadas
em desnortes, que entoam o vento
numa canção de chuva.

Gotícula a gotícula, sobrou pouco,
muito pouco, apenas a vontade de viver.

Abraçar o mundo na suavidade,
de um voo de pássaro,
que migra para não ficar,
nem estar no mesmo lugar.

Há desassossegos assim,
do tamanho de um olhar imóvel.

E o destino é esculpido em sal,
em mel, e cor, e nas estrelas
onde a luz é prodigiosa.


©Piedade Araújo Sol  2016-03-12

terça-feira, 8 de março de 2016

Os passos

Jenny Terasaki


Algures por aí
os passos caminham, insurrectos e ágeis,
por vezes por trilhos sem saídas,
ou por caminhos inóspitos,
e nem sempre recomendáveis,
___________eles vão.

Conduzem o corpo ,
repleto de sonhos e desencontros,
em galopes de vento.
O tempo voa e os passos voam com ele,
em aventuras impensáveis,
em  linhas contínuas, descontínuas,
em espelhos de azuis,em luz de estrelas.

Os passos levam-nos onde queremos,
e nem sabemos,
e muitas vezes onde nem queremos ,
e sabemos.
São emissários da nossa vontade,
por vezes egoísta e perversa.

Todos os passos valeram a pena.
Quando a lua pousou na tua face.
Todos os beijos se soltaram.

©Piedade Araújo Sol  2016-03-07

terça-feira, 1 de março de 2016

Não sei porquê


Peter Brownz Braunschmid
Não sei porquê, no outro dia
não te falei dos sonhos que ficaram derramados,
quando a porta se fechou.


Não gritei a ternura desprotegida que descambou,
estrangulada, nos dias cativos.
Talvez foi o vento, que enxugou  a lágrima que se concebeu,
quando a tarde tombou na cidade,
e o tempo  se esvaiu numa espera escusada.
E o relógio prendeu-se em noites,
de horas tresmalhadas.
O frio inquieto e sagaz molda-nos,
o corpo e a vontade,
apenas ficam os gestos.
E as mãos esquecem pousadas,
no fundo dos bolsos frios.
Talvez no outro dia,
talvez, o tempo escoou para dentro,
de outro tempo.
Outro tempo, talvez, que não era o nosso
ou será que era?
©Piedade Araújo Sol  2016-02-29