terça-feira, 27 de março de 2018

A quietude das águas

Diggie Vitt
O poeta chegou em Março, com o frio e a neve ainda no sangue.
Pediram-lhe que falasse da quietude das águas.
 Ele sorriu, porque sabia que do sossego nada sabia.
Nele, só existiam inquietações e tormentas.
O poeta olhou o céu e sentiu frio. 
Foi nessa altura que se olhou, já de pé, num banco de pedra.
 E falou do choro dos outros.

Alguns repararam que o poeta estava completamente nu.

©Piedade Araújo Sol 2009-03-17 (reeditado)

terça-feira, 20 de março de 2018

não era ainda o tempo

norvz austria
Para Graça Pires
não era ainda o tempo
a noite gerará um novo dia
para que consigas
pousar os teus lábios no poema.

e sabes que é como uma nascente
que quando nasce brota água
a diferença é que não será água
mas apenas letras que encalham no papel.

talvez nem sempre tenham o esplendor de uma
alvorada incandescente
mas nem sempre tudo será rubro
alucinado de fogo em ascensão.

pode surgir do nada,
e a tua alma limpará as janelas sombrias
e as abrigará de novo dando guarida
ao novo cantar dos pássaros.

nascerá em  toda a ternura tresmalhada
e na inquietação em desordenação
que se prenderá nos relógios
do tempo e do poema.

©Piedade Araújo Sol 2015-03-20 (reeditado)

terça-feira, 6 de março de 2018

Instantes

anka zhuravleva

Mar desgrenhado
Vento em desalinho
E um frio que cresce e que cobre o corpo

Quando o medo aperta, subo à escarpa mais alta,
e soletro o Teu nome.
Ninguém sabe do frio que me assola em dias de tempestade.
É mais simples assim.

Ninguém sabe de mim.
Nem eu sei.
E isso também nem importa.

 Além uma nuvem parece sorrir.

E trémulas as minhas mãos tombam desprotegidas
para dentro dos bolsos,
repletos de sonhos que ouso congeminar.

E soletro sem pressas o Teu nome, e lembro as cores
e a lucidez que guardo nas estações
das flores …

As flores e seus aromas…

Logo será primavera
e lembro as gardénias que existiam no parapeito da janela.

©Piedade Araújo Sol 2018-03-05